Campo Grande (MS) – O conjunto de laboratórios de análises da qualidade da água do Imasul (Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul) passa a se chamar Centro de Controle Ambiental Eni Garcia de Freitas, falecida em 2015, e que foi responsável pela idealização e estruturação do órgão. O Decreto número 14.798 oficializando a homenagem foi publicado em 14 de março de 2018, mas o ato oficial de descerramento de placas aconteceu na manhã desta sexta-feira (8), com a presença de familiares e amigos, e fez parte da programação de atividades alusivas à Semana do Meio Ambiente.
Bastante emocionado, o diretor presidente do Imasul, Ricardo Eboli, citou duas características que no seu entender definem o caráter de Eni: comprometimento e humanidade. “Ela empreendeu uma busca incessante pela perfeição, era muito pragmática, tudo precisava sair bem feito. Mas ao mesmo tempo não esquecia, não descuidava das pessoas de sua equipe”. Ao perpetuar seu nome no Centro de Controle Ambiental, segundo Eboli, o Imasul indica o exemplo de Eni Garcia de Freitas como o padrão de servidor a ser seguido por todos. “Eni continua conosco, sempre nos estimulando, sempre nos cobrando para que sejamos melhores a cada dia”.
Falando em nome dos servidores e amigos da homenageada, a advogada Marcia Corrêa – que dividiu com Eni a luta no órgão ambiental desde sua criação – lembrou as dificuldades que enfrentaram no início da carreira. “Em 1979, meio ambiente era uma questão. Ninguém falava disso. A Eni enfrentava tudo e todos para estruturar os laboratórios, fazia por amor”, disse. O gerente de Controle e Fiscalização do Imasul, Luís Mário Ferreira – que começou a carreira como aprendiz de Eni – também destacou esse traço do caráter da homenageada. “Tenho nela um exemplo de pessoa e profissional.”
Muito comovidos, os familiares não quiseram se pronunciar. Estavam presentes dois filhos de Eni, Paula Pilotto e Paulo Garcia; o viúvo Mário Pilotto, os irmãos Odair e Odir Garcia de Freitas e a mãe Fausta Ferreira de Freitas, além de primos, sobrinhos e muitos amigos, ex-colegas de trabalho já aposentados que compareceram para lhe render tributo.
O Centro de Controle Ambiental Eni Garcia de Freitas compreende os laboratórios físico-químico, bacteriológico e hidrobiológico, com bancada e equipamentos modernos, é considerado o melhor de todo Centro-Oeste. O Estado possui, atualmente, uma rede de 160 pontos de coleta de água. As amostras são trazidas para os laboratórios do Imasul e passam por análises diversas, para medir a qualidade das águas dos diferentes rios do Estado em diversas variáveis.
Com essas análises é possível: avaliar as condições atuais da qualidade da água; fornecer subsídios à gestão de recursos hídricos, com dados necessários aos processos de outorga, cobrança e enquadramento dos corpos de água; fornecer subsídios à gestão ambiental, gerando dados técnicos para embasar o licenciamento ambiental, a fiscalização ambiental, o controle da poluição das águas e a preservação da biodiversidade; gerar informações técnicas precisas sobre as condições atuais e as tendências da qualidade dos recursos hídricos do Estado, e divulgá-las à população em geral, usuários de recursos hídricos, órgãos públicos afins, ONG’s e imprensa.
A homenageada
Eni Garcia de Freitas nasceu em Camapuã no dia 20 de maio de 1.953, filha de Orozimbo Garcia de Freitas e Fausta Ferreira da Cunha. Formou-se em Biologia pela Universidade de Mogi das Cruzes (SP) em 1977 e especializou-se em Biologia Sanitária e Ambiental. Mãe de três filhos: André Luiz Garcia Campagna (falecido), Paulo Fernando Garcia Gonçalves e Paula Maria Pilotto Branco, essa última, fruto do casamento de 30 anos com seu segundo esposo Mario Cesar Pilotto Branco. Sua conduta ilibada, dedicação, esmero e rigor no exercício profissional são exemplos que inspiram os servidores do Imasul e motivo da proposição da presente homenagem.
Iniciou sua carreira ainda na década de 70, no interior de São Paulo, lecionando como professora de Biologia. Quando da criação do Estado de Mato Grosso do Sul, em 1977, Eni ingressou no serviço público e participou da elaboração da estrutura administrativa da área ambiental da nova unidade federativa. Sua determinação foi notada e é marca lembrada por todos os colegas que compartilharam de sua trajetória. No Imasul é lembrada como uma profissional criteriosa, exigente, meticulosa, com fama de quem não desistia nunca de seus objetivos. Enfrentava, com muita determinação e valentia, as mais diversas dificuldades técnicas e administrativas para garantir aquisições de estrutura e de equipamentos de alta qualidade e de padrão internacional para o laboratório.
No início da década de 90 o governo federal lançou o PNMA (Programa Nacional do Meio Ambiente – Fase I). Surgiu a oportunidade de Mato Grosso do Sul ter um laboratório de análise da qualidade das águas, tarefa que Eni abraçou com entusiasmo e afinco. Relatos de seus colegas da época dão a dimensão do envolvimento de Eni na causa. “Brigava por milímetros de diferença numa balança, exigia equipamentos de primeira, cuidava de absolutamente tudo, o que por muitas vezes lhe deixava extremamente preocupada até com as pequenas coisas”.
Nada foi capaz de demover Eni do seu propósito. Ela não só construiu e estruturou o laboratório do Imasul com todos os equipamentos necessários, como bancadas, luminárias, equipamentos de proteção, além das consultorias externas para dar treinamento à equipe que ela havia contratado. Na época que começou a luta para implantar o Laboratório do Imasul a equipe se resumia a duas pessoas. Hoje o Estado conta com 156 pontos fixos de monitoramento de qualidade de água, uma equipe técnica capacitada e motivada para conduzir com competência a função de monitorar e avaliar a qualidade da água de nossos cursos hídricos.
No curto período em que trabalhou na implantação do Laboratório do Imasul, Eni acumulou importantes vitórias em seu currículo: Em 1990 foi nomeada diretora do Departamento de Controle de Atividades Poluidoras do Imasul; até o fim dos anos 1980 já havia coordenado ou participado de sete importantes estudos científicos – a maioria sobre capivaras – que foram divulgados em publicações especializadas. Somam três dezenas os trabalhos científicos concluídos e publicados, com destaque para o estudo sobre Crescimento e Desenvolvimento das Capivaras que detectou a presença do parasita Trypanossoma no roedor e o primeiro Relatório de Qualidade das Águas Superficiais da Bacia do Alto Paraguai (1999), já resultado das análises feitas no laboratório do Imasul. Pouco antes de se aposentar, em 2008, Eni coordenou a elaboração do Plano Estadual de Recursos Hídricos.
Tanta dedicação teve um preço que Eni dividiu com a família. “Não poucas vezes passei os fins de semana lhe fazendo companhia na SEMA para que ela cumprisse os compromissos de trabalho”, conta a filha Paula Pilotto, na época uma menina. A paixão da Eni pelo Imasul foi algo ímpar, inexplicável, e, ao mesmo tempo, extraordinário. Tudo ao seu redor era impecável. “A carreira da minha mãe foi repleta de muitas conquistas de extrema importância. Foram inúmeras palestras proferidas por todo o Brasil. Em 1994 foi cedida pelo governo para realizar um treinamento técnico na Universidade da Flórida, em 1998 recebeu o prêmio ‘Mulher que faz a diferença’ na área do Meio Ambiente pela Federação das Associações de Mulheres de Negócios e Profissionais do Brasil, além de inúmeros relatórios sobre qualidade de água. Temos a certeza que ela tinha a noção da importância do seu trabalho para o Meio Ambiente e para o Estado”, relata Paula Pilotto.
No início dos anos 2000, Eni saiu do laboratório e foi trabalhar na área de Licenciamento Ambiental. Poucos anos depois descobriu a leucemia. Em 2010, após 30 anos de uma carreira brilhante, Eni Garcia de Freitas requereu a aposentadoria. Teve poucos anos para desfrutar com a família. Faleceu no dia 17 de junho de 2015 e seu corpo foi sepultado no Cemitério das Primaveras, em Campo Grande.